Charoco

Durante a minha primeira infância surgiram na minha casa dois animais. Um lindo gato e um cão.

Devem estar a perguntar-se, porquê um lindo gato e um simples cão. O facto é que do cão não tenho qualquer recordação, deveria ser um belo animal mas, não me recordo da sua aparência nem o que lhe aconteceu.

Do gato não sei o nome que lhe puseram, só sei que passou a ser “Charoco” pois era o que eu lhe chamava. Filho de gata mansa, comum europeu como se diz hoje, e de um gato bravo que vivia nos campos circundantes, grande como só ele, cabeça achatada, listado de preto e cinzento era o meu grande amigo. Eu diria mais o meu grande protetor.

Como todos os gatos de aldeia, vivia connosco mas tinha total liberdade de entrada e saída de casa. Dormir, dormia na rua que era o local indicado. E andava por onde lhe apetecesse, tinha liberdade total.

Todas as manhãs, às sete horas, miava à janela do quarto dos meus pais e não se calava enquanto não a abrissem.

Entrava, colocava-se junto à minha cama e miava, só parava quando eu tirava a mãozinha para fora da cama. Passava o seu pelo pela minha mão. Deitava-se ao lado da cama e esperava que eu me levantasse.

Para onde eu ia ele acompanhava-me como faria um cachorro. Ninguém me podia tocar sem que os meus pais deixassem.

Tenho uma fotografia em que estou sentada no chão comendo uma tijela de romã e o meu Charoco deitado a meu lado, só se vêem os quartos traseiros e a sua cauda, mas lá está o meu grande amigo.

Não tinha medo de nada, nem sequer dos cães mais ferozes. Contava a minha mãe que um dia se lançou a um cão, perito em matar gatos, e que o fez fugir com o rabo entre as pernas. Convém acrescentar que foi o cão que o atacou e não o contrário, ele só se defendeu. Não pensem que ele era um arruaceiro.

Eu cresci e ele continuava a ser o meu grande amigo.

Um dia vim viver para a cidade e o gato ficou com a minha avó e a minha tia. Os meus pais não quiseram prejudicar o animal trazendo-o para um sítio diferente e privá-lo da sua liberdade.

Sempre que voltava à aldeia lá estava ele à minha espera. Era uma alegria reencontrá-lo, acariciá-lo e brincar com ele.

Eu cresci e ele foi envelhecendo.

A minha avó tinha alguns pombos. De repente começaram a aparecer alguns mortos e alguém começou a afirmar que era o meu gato.

Como já estava velho, com poucos dentes e mais frágil, pensaram que a dificuldade em caçar livremente o empurrou para a caça fácil de pombos presos, não que lhe faltasse alimento mas toda a gente sabe que os gatos são caçadores por natureza.

Não sei o que passou por aquelas cabeças, decidiram abater o animal.

O meu desgosto foi muito grande, tinham matado o meu gato e eu não queria acreditar.

Os pombos continuaram a aparecer mortos. Finalmente descobriu-se o verdadeiro culpado. Um seu filho, extremamente parecido com ele, era o vil caçador.

Mataram um inocente e eu perdi um grande amigo.

Ainda hoje o lembro com carinho e saudade.

Era o meu Charoco.

 

Fortunata Fialho em “Simplesmente… Histórias”

Brevemente nas livrarias.

 

Extremamente parecido ao meu.

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Confiança…

Confiança …

Confiar em alguém nem sempre é fácil. Não confiarem em nós é muito doloroso.

Quero poder confiar naqueles que amo e sentir que confiam em mim.

Quero acreditar que quem me rodeia é de confiança.

Toda a vida, tenho lutado para não trair nem ser traída.

Ninguém pode viver, feliz, sem se sentir seguro.

Todos se deveriam certificar de que a sua palavra é verdadeira e a sua atitude firme e honesta.

Quando amamos confiamos, quando prometemos cumprimos, quando dizemos tem de ser sempre verdade.

Parece utopia… Sim mas só porque as pessoas não se esforçam.

Já por muitas vezes confiei e fui traída. Sofri, pois a traição sempre veio de pessoas que o não poderiam ter feito, de pessoas que deveriam ter sido leais, de pessoas de quem gostava.

Por momentos decidi não voltar a confiar mas, viver na desconfiança não é viver. Preciso de confiar para ser feliz.

Mesmo correndo o risco tenho que conseguir confiar. Como costumo dizer, começo a confiar desconfiando. Parece idiota mas é mais seguro.

A confiança une, a desconfiança separa. Ser confiante não é, forçosamente ser ingénuo. Ser confiante é acreditar na honestidade e na integridade.

Seria bem mais fácil viver sem desconfiar, sem temer a traição, sem ter que olhar por cima do ombro. A amizade e a sinceridade são o que mais desejo.

Só podemos amar se nos sentir-mos seguros, apoiados e sobretudo respeitados.

Por favor, sejam pessoas íntegras, pessoas de confiança. Confiem e sejam confiáveis.

 

 

Fortunata Fialho em ”Simplesmente… Histórias”

Brevemente nas livrarias.

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Chegou o Outono.

Chegou o Outono. Lá fora o sol encontra-se oculto por um denso lençol de nuvens. Chuva, muita chuva, este ano não deixa de chover.

Os campos estão saturados de água. O caudal dos rios aumenta significativamente. As águas estão barrentas não deixando ver nada do que existe no seu interior.

Enormes gotas de chuva colidem com a minha janela. Em sintonia com este tempo o ambiente em casa está triste e deprimente. Precisamos urgentemente de luz e alegria.

O sol espreita, timidamente, por entre o emaranhado de nuvens, um pássaro canta no beiral e no meu rosto surge um sorriso.

O efeito do sol nas nuvens é simplesmente maravilhoso. As nuvens irradiam fogo, luz branca e reflexos dourados. Raios solares projetam-se na terra em forma de traços desenhados por um artista excecional.

Enquanto aprecio este espetáculo de cores, uma nuvem negra surge e destrói tudo.

De repente, vinda do nada, presenteia-nos com um pequeno dilúvio. As ruas transformam-se em rios e a água precipita-se tentando encontrar caminhos que nunca lhe pertenceram. Casas inundadas, ruas intransitáveis, plantas destruídas e pessoas assustadas. Tal como surgiu, subitamente, a chuva cessa e, lentamente, tudo volta à normalidade.

O sol volta a surgir lutando, com as nuvens, por um lugar onde espraiar os seus raios e presentear-nos com o seu calor.

Ondas de calor percorrem as ruas aquecendo o chão e evaporando a água.

Novamente soa o chilrear dos pássaros e as flores parecem agradecer o calor que lhes é oferecido.

Tons alegres iluminam o mundo que me rodeia.

Sorrio de felicidade. Como é bonito o ambiente que me envolve!

Depois de tanta chuva e sombra, como é bom sentir o calor e a alegria que reina à minha volta.

A minha casa, subitamente irradia a alegria e boa disposição típicas dos dias soalheiros de verão.

Como é perfeito o sol de Outono! Reconfortante e acolhedor conforta a alma e alegra o meu mundo.

Decido sair, passear um pouco e aproveitar este presente soalheiro. Abro a porta e, surpresa chove novamente.

Estamos no outono e o tempo, este ano está incerto.

A chuva bate novamente na minha janela aumentando de intensidade.

Paciência… chegou o outono.

 

Fortunata Fialho em ”Simplesmente… Histórias”

Brevemente nas livrarias

Cortesia da filhota.

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Diário do Sul

A Chiado Editora organiza um grande encontro de poetas, no dia 23 de outubro, às 15h00, no Teatro Tivoli BBVA, para assinalar o lançamento da Antologia de Poesia Contemporânea “Entre o Sono e o Sonho” Vol. VII, que integra textos de oito autores eborenses.

Os atores Custódia Gallego e Carlos M. Cunha são os diseurs convidados que irão declamar textos por si selecionados, de entre os 1.000 que integram esta antologia, da autoria de poetas consagrado,s mas também de novos talentos que veem agora os seus textos publicados.

Este projeto resulta de um repto lançado pela editora, aberto a todos os portugueses, que levou a que fossem recebidos mais de 5.000 textos no espaço de um mês, dando corpo a uma interessante reflexão sobre a poesia contemporânea em língua portuguesa, uma vez que os seus autores variam em género, idade, formação e vocação.

A iniciativa enquadra-se no posicionamento da editora, apostada num catálogo em que convivem, de forma salutar, autores consagrados com valores emergentes em língua portuguesa, democratizando o acesso ao livro e à cultura.

 

Os poetas eborenses que participam nesta antologia são: Ana Figueiredo, Ana Gomes, Anabela Risso, Cristina Ramalho, Cristina Vilhena, Fortunata Fialho, Joaquim Jorge de Oliveira e Margarida Estevinho.

Autor: Nota de Imprensa

 

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Crianças.

Olhos brilhantes,

Sorrisos marotos.

Risos genuínos,

Amuos constantes.

E as Birrinhas?

Formas de protesto na sua ingenuidade.

Lábios estendidos em beicinhos fofos.

Beijos molhados,

Abraços apertados,

Grandes chi-corações.

Olhos atentos,

Descobrindo o mundo.

Ávidos de novidades e de carinhos.

Chamamentos doces,

Pedindo miminhos.

Basta um sorriso nosso e os olhitos brilham,

Surgem as gargalhadas.

Finalmente o sono e dormem calmamente,

O sono dos inocentes.

 

Fortunata Fialho em ”Sentidos ao Vento (Momentos)” meu primeiro livro.

 

Imagem retirada da internet

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Saudade

Quando a saudade chega, as lágrimas correm.

Relembro os bons e os maus momentos,

As conversas entre as duas,

A partilha de experiências.

A ajuda que me deste com os meus filhos,

O amor que eles te têm, ainda hoje.

Sabes, parece que ainda ontem estávamos juntas!

Que ainda ontem te podia abraçar, beijar e desabafar.

Mesmo com as tuas ideias antiquadas,

Deste-me a melhor educação que podias ter dado.

Graças a ti e ao pai tornei-me na pessoa que sou.

Ensinaram-me o respeito, a estima,

A tolerância e a humanidade.

Estou triste e choro.

Choro a tua ausência.

Choro não poder ouvir a tua voz.

Choro a falta da tua companhia.

Sabes, por vezes falo contigo,

Na esperança de me responderes.

Tenho sonhado contigo e,

Nos meus sonhos a tua presença é tão real

Que chego a pensar que voltas-te.

Preciso de ti.

Preciso da tua força e coragem.

Preciso do teu silêncio e da tua presença.

Preciso de ti minha mãe.

 

Fortunata Fialho em ”Sentidos ao Vento ( Momentos)”

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Invisivel

Como eu gostava de ser invisível!

Poder fazer o que quero, sem dar nas vistas,

Passar despercebida aos imbecis,

Descobrir as reais intenções das pessoas,

Não ter de me importar com o meu visual

E, sobretudo, fugir dos problemáticos.

Poder dar conselhos parecendo a consciência dos Próprios.

Há quem só assim os aceite.

Talvez assim conseguisse resolver alguns problemas,

Do país e, quem sabe, da humanidade.

É obvio que estou sonhando,

Não tenho a pretensão de ser Deus.

Nem que os meus conselhos sejam sempre bons.

No entanto, seria curioso tentar e ver os resultados.

Não sou de dar ordens mas,

Um bom conselho sim.

Não sou invisível e não posso forçar ninguém a

Agir de forma diferente.

Só gostaria de contribuir para melhorar este

Mundo louco.

 

Fortunata Fialho em ”Sentidos ao Vento”  Editora Bubok

ou ”Momentos” na Amazon.com

 

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Hoje… Amanhã…

Hoje estou triste, amanhã prometo acordar feliz.

Hoje o meu coração chora, o sentimento de perda é avassalador.

Amanhã vou acordar e dizer, para mim mesma, aproveita e sê feliz.

Hoje o céu está cinzento, a chuva cai e o vento assobia.

Amanhã quero sol e luz.

Hoje sou a mais insignificante das criaturas.

Amanhã serei a mais realizada das mulheres.

Hoje olho o infinito, amanhã o infinito, serei eu.

Hoje observo a penumbra, amanhã contemplarei o sol e as estrelas.

Hoje sou a sombra, amanhã serei luz.

Hoje tudo em meu redor é feio e desolador.

Amanhã só irradiará beleza e cor.

Hoje o mundo está em guerra, amanhã tudo será paz e harmonia.

Hoje estou assustada, amanhã serei a personalização da coragem.

Hoje sou insignificante, amanhã serei musa de inspirações.

Hoje durmo, amanhã, ao acordar, estarei viva e feliz.

Hoje … não faz mal, amanhã … tudo se resolve.

 

Fortunata Fialho em ”Simplesmente… Histórias”

Brevemente nas livrarias

 

Cortesia da Mana.

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Noite

É noite, no céu brilham as estrelas, ao longe pia uma coruja e está um frio que parece cortar a pele.

É noite e, na quietude do meu lar, escrevo.

Pela noite desfilam sombras, escondem-se criaturas e, na penumbra deambulam aqueles que se ocultam da luz do sol.

Sons abafados rompem o silêncio. Os caçadores começam a sua rotina. Pela calada da noite avançam, sorrateiramente, cercando as presas investindo não lhes deixando saída.

É noite, faz frio e eu sonho. Sonho com um mundo oculto de todos, com um mundo mágico e surpreendente.

Nos meus sonhos existem deuses e demónios, santos e pecadores, sombras e luzes.

No meu mundo de sonho tudo é possível, o real e o imaginário fundem-se.

Neste meu mundo impera a justiça e a aceitação, todas as criaturas são iguais e, sobretudo, civilizadas.

No meu mundo todos coabitam sem rancores, sem lutas, sem fanatismos, sem ódio.

Anjos e demónios convivem no respeito e tolerância. Sim porque em todo o anjo habita um demónio e em todo o demónio existe um anjo.

Todos são seres, todos têm sentimentos, todos têm o seu lugar e todos colaboram.

É noite mas no meu mundo vive-se iluminado. A luz vem de dentro dos seus corações e ilumina a vida de todos. A sua luz é partilha, a sua luz é compreensão.

Nesta noite de iluminados teme-se o dia. No dia existe ódio, fanatismo, violência, maldade, racismo e tantos outros demónios exilados da minha noite.

A minha noite é pura, segura, aconchegante e maravilhosa. Aqui o que conta é a beleza interior, o aspeto é só uma capa que protege das intempéries. Na minha noite o respeito conquista-se, não se compra.

Quero permanecer aqui, não quero acordar.

Deixem-me continuar a sonhar.

Deixem-me na minha noite.

É noite e vou dormir. Espero continuar o meu sonho e, amanhã quando acordar quero que o dia seja como a minha sonhada noite.

Melhor, quero que o dia de todos seja igual ao meu sonho.

Quero que para sempre os dias sejam assim ou, se isso não poder ser, que seja sempre noite, a minha noite.

É noite e eu sonho…

 

Fortunata Fialho em” Simplesmente… Histórias”

Brevemente nas papelarias.

 

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